Pierrot

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Quando morrer, talvez tenha uma ideia formada sobre mim, se o destino me der esse luxo.

Friday, November 28, 2008



O Condenado


Conta uma antiga e apagada lenda
Em tempos idos onde ainda não havia legenda
Que um homem fora injustamente acusado
Da sua fiel e honesta mulher ter assassinado.


Na verdade, o autor era pessoa bem influente do Reino
E este mais não era do que um pobre coitado
Real candidato mas para a forca do terreiro
De forma a acobertar o assassino renegado.


O pobre homem foi arrastado para o julgamento
Como um teatro cínico de falso procedimento
Foi mirado com desdém desde o padre até ao talhante
Onde a justiça não estava no juíz mas na corda do palanque.


O homem era analfabeto e de origem simplória
Mas já percebera que não sairia vivo desta história
Do cadafalso já não podia rezar ou esperar pela justiça
Uma vez que até o destino lhe debicava a carniça.


Mas o Juíz, do alto da sua manhosa equidade
Propôs ao pobre homem um jogo de sorte
Num papel escreveria inocente e a consequente liberdade
No outro escreveria culpado e a inevitável morte.


“Plebeu”..., disse o Meritíssimo lá do seu púlpito
“Serás tu a sortear um dos fatídicos papeis”...
“Será o Senhor a decidir no seu dom infinito”...
“Deixando nas mãos divinas qual o destino que mereceis”.


Mas esta vã religiosidade e traiçoeira ruindade
Fez o Juíz escrever sempre o mesmo e triste fado
Em qualquer dos papeis estaria sempre a falsa verdade
Culpado, culpado, culpado...


O Homem reflectiu alguns segundos e meio fulo
Depressa percebeu a aldrabisse que o tramava
Vai daí correu até à mesa e de um só pulo
Engoliu um dos papeis de uma só assentada.


“Tolo, infame, desgraçado” gritaram os presentes
“Meu reles assassino, que foste tu fazer?”
E o Juíz apontando ao alegado demente
Vociferou, “e agora , como irá Deus proceder?”


E o Condenado que de otário nada tinha
Troçou dos Homens e disse-lhes num tom de gosto
“Fácil Meritíssimo...leia o papel que está na sua escrivaninha
E verá que engoli e escolhi precisamente o oposto”.


Um hino à inteligência quis escrever
Gritar contra a injustiça "Do" que decide.
E se a Alma jamais deixará de sofrer
A Raíz do Pensamento, essa, será sempre livre.


Texto de origem desconhecida
Adaptação para poema de Eugénio Rodrigues – Outubro 2007

Sugestão musical: Jeff Buckley - Last Goodbye

Monday, November 10, 2008

Sem Ar




SEM AR


Perguntas-me como é suposto respirar sem Ar,
Como é viver num mundo em que sempre tapas a tua boca?
Empreendes lutas de verdade por uma felicidade qualquer
Que se desfaz à custa de mil moinhos de vento.
São como gigantes que se erguem para espezinhar os teus sonhos
Para reduzir a pó os teus parcos sorrisos
E para te lembrar que tu já morreste
E que não podes viver novamente.


O vento que te cruza o rosto é de um Ar que não tens
A côr que te carrega a alma é cinzenta de um chumbo triste e frio.
Não tens culpa mas também não precisas
Pois quem vive longe da sua vida
Apenas precisa de acordar todos os dias
De se levantar para seguir um caminho qualquer.
De narrar as histórias dos outros e as suas alegrias
De escolher, algures entre o nenhures e o que vier.


Ora...não és Poeta nem coisa nenhuma!
És um Espantalho a quem nem os corvos respeitam.
Não és Palhaço, não tens piada, nem és inteligente
És um falhado, nem um pouco mais do que mais alguém!
Morrerás anónimo pois mais não mereces
E sobretudo aliviado por não teres glória nem ter de regressar
Foste condenado a não teres lágrimas nem preces
A viver num mundo em que não tens Ar para respirar.


Eugénio Rodrigues, Novembro 2008

Foto de Rosalina Afonso

Sugestão musical No Air - Jordin Sparks feat Chris Brown