Pierrot

My Photo
Name:
Location: Porto, Portugal

Quando morrer, talvez tenha uma ideia formada sobre mim, se o destino me der esse luxo.

Saturday, September 26, 2009

Vem e vai




Vem e vai


A coisa vem e vai
Como o vento que num dia nos bate no rosto
Ou como a gravidade da razão e da moral que nos derruba
Como a ideia que num ápice nos faz sorrir e renascer
Ou como no pesadelo que nos reduz ao tamanho da nossa insegurança
Ruído estridente que nos corta a respiração
Ou Som abafado que enrouquece o violino.


A coisa vem e vai
Como a alegria de conseguir ver o desabrochar de uma flor
Ou como a tristeza de ver cair um olhar
Como um objectivo está lá no fundo e nos agarra a mão
Ou como um sonho que ganha a forma errada
Como uma sombra que foge de nós próprios
Ou como a vergonha que cora sozinha.


A coisa vem e vai
Como o ânimo que renasce de tempos a tempos
Ou como o desalento que nos puxa o braço
Como o desgosto que não se explica
Ou Como o sol que teima sempre em brilhar
Como a amizade que nunca se consegue esquecer
Ou como a solidão que se acaba por desejar.


A coisa vem e vai
Como a musica que nos muda o espírito
Ou como a escuridão que emudece os pássaros
Como a Diáspora lusitana que teima em nos fazer grandes
Ou como a pequenez da mente que não arranja palavras para se explicar
Como o bater singelo e afinado de uma tecla de um piano
Ou como a lágrima que cai de tempos a tempos.


A coisa vem e vai
Como os tempos que não queremos deixar fugir
Ou como a estrela que cai dos céus e de vez se apaga
Como o respirar que finalmente se detém
Ou como uma tatuagem que quer gritar e ganhar vida
Como a fotografia que teimosamente não para de nos manter vivos
Ou como as horas em que nada queremos escutar.


Vá, mostra-te, destino miserável qual ave de rapina...
Ou preferes mais uma vez esconder-te na minha tristeza galopante?
De ninguém não queremos mais nada
De nada não queremos mais tempo
Do tempo não queremos a lembrança
Da lembrança só queremos o esquecimento
Do esquecimento queremos permanecer para a eternidade
Porque o que é eterno afinal, vem mas já não vai!


Eugénio Rodrigues Setembro 2009
Foto de Eugénio Rodrigues
Sugestão musical Soap and Skin – Cynthia

Monday, September 07, 2009

Em que é que eu posso acreditar?




Em que é que eu posso acreditar?


Em que é que posso acreditar
Se tudo me parece tão simples
Tudo me parece tão frio
São cores que gelam tudo o que eu tenho
Tudo o que eu espero
Tudo o que eu desejo.
O maior calafrio não é o que me corre nas mãos
Mas o que se aloja na alma
É aquele que não consigo tocar mas apenas sentir.


Em que é que eu posso acreditar
Se ensurdeci aos que os outros me dizem?
Todos não passam de corvos errantes
Cujo grasnar se confunde com o rir de mim.

Em que é que eu posso acreditar
Se de bom nada consigo sentir?
As intuições foram-se como o vento
Os prémios já não interessam
Apodrecem no pó das prateleiras
Nas memórias que jazem sem valor.


Em que é que eu posso acreditar
Se já nem me lembro da 1ª vez que disse “amo-te”
Ou da última vez que gritei “eu vivo”?


Como se acredita quando tudo o que se quer é desistir?
Como se acredita quando já não se “cresce”?
Como acreditar se os meus pés são o meu horizonte
E se as minhas passadas são a única coisa que nunca falha?
São o único pedaço do tempo que nunca volta atrás?
São palavras, sonhos e lágrimas que saltam do papel
Como pássaros que rasgam os céus azuis
Como o último asgar de um moribundo que desejaa morrer.


Quem sabe se acreditar não é querer respirar debaixo de água
Não é querer encher os pulmões em Marte
Não é deixar de ouvir as vozes mais sensatas
Não é pensar que posso isolar um rosto
Num singelo frame para o resto do meu tempo.


Quem sabe se acreditar não é resistir à descrença
Não é ter uma canção favorita que mais ninguém goste
Não é lutar para que os poemas ganhem vida
Não é descobrir que afinal há flores que nunca morrem.


Eugénio Rodrigues

Foto de origem desconhecida

Sugestão musical Boss AC e Mariza - Alguém me ouviu

Monday, August 31, 2009

Ouvi dizer




Ouvi Dizer


Ouvi dizer que o tempo não passa por mim
Ouvi dizer que já não fazem leis para me ajudar
A perceber este tempo que teima em não mudar.


São palavras que nunca ouvi, letras que nunca li, sentimentos que não senti
Ajudam-me dando-me os abraços que pousam nos outros
Mãos bem fechadas de sorrisos por desvendar.


Ouvi dizer que se pode ser feliz sem precisar de espelho,
Ou de se conhecer o caminho que se quer percorrer
Ouvi dizer que a vida é uma linha continua de quadros por pintar
E onde as cores são as gentes que vamos conhecendo.


Ouvi dizer que o mundo só existe quando realmente o mudamos
Onde a Amizade é o arrepio bom,
É o trigo selvagem que cresce na beira da estrada,
Sem que ninguém perceba como nem com que motivo.


Ouvi dizer que as guitarras já tocam acordes
Salteados numa brisa com batuques mudos de roucos tambores
Serão por certo versos que cantam Odes
Devem ser danças que me contam como rumores.


Um Fado triste de uma saudade que desconheço.
Um medo que se veste de cores lilases e de esperança
Um bater de um coração que não é meu nem tem endereço
Um sorriso que passa de olhar em olhar sem nada de ti
E tudo isto porque sempre ouvi dizer... mas nada vi!


Eugénio Rodrigues Agosto 2009

Foto de Rosalina Afonso

Sugestão Musical: Rolling Stones - "You cant always get what you want"

Friday, February 06, 2009

Humanos, esses seres tão estranhos!



Homens, esses seres tão estranhos!


Meus amigos Felinos, esta é uma carta aberta que vos deixo para que de alguma forma possamos entender, se é que é possível, os Homens e o que eles fazem no nosso mundo.


Desde que me conheço e por certo, como muitos de vocês, vivo num armazém velho.
O meu dia é muito completo e pouco tempo livre me sobra para outras coisas. Entre saltar de caixote em caixote, brincar com uns amigalhaços que nasceram ou cresceram comigo, dormir num sofá gasto, ainda tenho de convencer uns senhores, muito simpáticos diga-se, a darem-me de comer todos os dias. Tenho pena de não os poder ajudar mais, mas acho que a minha companhia para eles, é suficiente. Noutro dia até lhes ofereci um ratito. Ficaram todos contentes. Estranho... os ratitos não valem nenhum, mas enfim, vá se lá entende-los. Se gostam de bocados de metal redondo, papeis rectangulares e até coisas grandes com rodas, não me admira que fiquem contentes por lhes caçar um rato.


Mas estava eu uma lua destas, no mesmo sitio do costume e na minha azafama diária, quando pelo jantar, os senhores meus amigos receberam outros senhores. Traziam umas caixas em plástico e outras em grade. Puseram a minha comida dentro da grade e depois quando lá fui, prenderam-me, passando-me de imediato para as outras caixas. Achei tão estranho aquilo, e até me cheguei a assustar, mas vá-se lá perceber o que vai na cabeça dos Humanos. Não tardou estavam a tirar-me da caixa, num sitio diferente do meu armazém velho. Cheirava aquele liquido que me tentam por nos olhos e que eu detesto. Depois não me lembro. Sei que senti uma picada e deu-me o sono. É estranho pois não me costuma dar o sono aquela hora, mas devia ser da agitação que me cansou. É, devia ser...


Quando acordei, senti-me bem, mais tranquila até do que quando entrei. Tinha era uma costura na barriga e um cheiro ao tal liquido (será que os Humanos bebem daquilo?) e num ápice, estava de volta ao meu lindo armazém. Achei-o um pouco mais desarrumado, mas isso é natural digo eu, pois estive fora umas horas. O senhores lá estavam, simpáticos como é habitual e com a comida que eu os convenço a darem-me, em troca da minha amizade. Creio que isto é algo que resulta estranho entre os próprios humanos, mas connosco funciona.
Hoje já não lutamos pela comida uns com os outros e até já toleramos mais amigos dos nossos. Não nos ferimos tanto e por isso também não adoecemos com tanta facilidade.
Engraçado... pergunto-me porque não poderão ser assim os Humanos?


Bom, esta é como vos disse, uma carta aberta a todos vós, para que percebam um pouco melhor aqueles a quem damos companhia e o que por vezes nos fazem a nós. Basicamente eles são uns porreiraços, só que ainda não o perceberam. Pudera, também andam aqui só há uns biliões de luas... ainda é cedo.


Ah, eu sou a ATCHIM. Chamam-me assim porque andava sempre com os olhos remeladitos e a fungar. Volta e meia espirrava e tal e vai daí, o nome.
Não liguem se fizerem o mesmo convosco. Eles gostam de por nomes a tudo... coisa de Humanos!


Eugénio Rodrigues, Fevereiro 2009
Homenagem à Associação Catus Porto e ao seu meritório voluntariado
Fotografia de Gonçalo A. Dias
Sugestão musical: Rui Veloso – Pequena dor

Monday, January 19, 2009

Sonhar vivendo



Sonhar vivendo


Um incenso de baunilha liberta um fumo branco e espesso
Transporta-me nas ideias enquanto me imagino a dançar
Como que levitado do sofá onde me encontro a relaxar
Espero por ti, ao som daquela nossa música especial
Imagino as letras ganharem forma no meio das tuas fotos espalhadas.


Neste fim de tarde, entram pela janela as luzes da noite
O amarelo fosco e enfraquecido dos lampiões da cidade
Entrelaçado pelo arco íris dos néons da publicidade
Dão um reflexo inebriante por entre as gotas do vidro embaciado
Com o dedo em riste e suspenso no ar, desenho o teu nome como um pecado.


Busco nos meus ficheiros mentais, como foi da última vez
A chama da lareira reluz nos meus olhos de quem sonha que vive
Lembro-me do que não me posso esquecer pois nunca te tive
E neste ambiente opaco do inconsciente que me empalidece a tez
Tapas-me os olhos com as mãos enquanto me beijas o rosto.


Não te senti chegar, talvez fosse do vinho tinto ou do cansaço
Mas o teu perfume está aqui no meio das minhas coisas e do meu espaço
Embrenhado nas folhas onde comecei a escrevinhar linhas tortas
O teu beijo arrepia-me e anula-me deixando-me entregue a um regaço
Esmagas-me, os teus dedos percorrem-me o peito como veludo de aço.


Agarrei-te meio perdido no rebolar suave pelo tapete.
De pernas entrelaçadas e despidas das vestes frias e húmidas.
A tua pele macia preenche-me os sonhos e os devaneios.
A roupa jaz perdida algures pela sala tal como o tempo
Tudo parou excepto os nossos corpos por entre a luz trepidante.


(...)


As mãos abrem-se lentamente enquanto a alma fumega
A tensão da carne dá lugar ao respirar pausado que se despega
Tudo vai parando de girar, e os pés frios regressando ao chão
E o que tens tu no final do dia para poder levar contigo?
A tua memória, as tuas palavras, o teu tesouro é o teu rosto são.


Reparas que à tua volta tudo permanece imutável.
Os mesmos cegos continuam à janela com a mesma Dor para lá dos olhos
O que tens tu no final do dia, senão uma garrafa de tinto
Uma lareira acesa e uns quantos esquissos espalhados como a vida.
Afinal estás só, mergulhado num sonho repleto de fotografias.


Vives a sonhar ou sonhas a viver...


Eugénio Rodrigues, Janeiro 2009
Foto de Rosalina Afonso

Sugestão Musical: The Script - The Man who can't be moved

Friday, November 28, 2008



O Condenado


Conta uma antiga e apagada lenda
Em tempos idos onde ainda não havia legenda
Que um homem fora injustamente acusado
Da sua fiel e honesta mulher ter assassinado.


Na verdade, o autor era pessoa bem influente do Reino
E este mais não era do que um pobre coitado
Real candidato mas para a forca do terreiro
De forma a acobertar o assassino renegado.


O pobre homem foi arrastado para o julgamento
Como um teatro cínico de falso procedimento
Foi mirado com desdém desde o padre até ao talhante
Onde a justiça não estava no juíz mas na corda do palanque.


O homem era analfabeto e de origem simplória
Mas já percebera que não sairia vivo desta história
Do cadafalso já não podia rezar ou esperar pela justiça
Uma vez que até o destino lhe debicava a carniça.


Mas o Juíz, do alto da sua manhosa equidade
Propôs ao pobre homem um jogo de sorte
Num papel escreveria inocente e a consequente liberdade
No outro escreveria culpado e a inevitável morte.


“Plebeu”..., disse o Meritíssimo lá do seu púlpito
“Serás tu a sortear um dos fatídicos papeis”...
“Será o Senhor a decidir no seu dom infinito”...
“Deixando nas mãos divinas qual o destino que mereceis”.


Mas esta vã religiosidade e traiçoeira ruindade
Fez o Juíz escrever sempre o mesmo e triste fado
Em qualquer dos papeis estaria sempre a falsa verdade
Culpado, culpado, culpado...


O Homem reflectiu alguns segundos e meio fulo
Depressa percebeu a aldrabisse que o tramava
Vai daí correu até à mesa e de um só pulo
Engoliu um dos papeis de uma só assentada.


“Tolo, infame, desgraçado” gritaram os presentes
“Meu reles assassino, que foste tu fazer?”
E o Juíz apontando ao alegado demente
Vociferou, “e agora , como irá Deus proceder?”


E o Condenado que de otário nada tinha
Troçou dos Homens e disse-lhes num tom de gosto
“Fácil Meritíssimo...leia o papel que está na sua escrivaninha
E verá que engoli e escolhi precisamente o oposto”.


Um hino à inteligência quis escrever
Gritar contra a injustiça "Do" que decide.
E se a Alma jamais deixará de sofrer
A Raíz do Pensamento, essa, será sempre livre.


Texto de origem desconhecida
Adaptação para poema de Eugénio Rodrigues – Outubro 2007

Sugestão musical: Jeff Buckley - Last Goodbye

Monday, November 10, 2008

Sem Ar




SEM AR


Perguntas-me como é suposto respirar sem Ar,
Como é viver num mundo em que sempre tapas a tua boca?
Empreendes lutas de verdade por uma felicidade qualquer
Que se desfaz à custa de mil moinhos de vento.
São como gigantes que se erguem para espezinhar os teus sonhos
Para reduzir a pó os teus parcos sorrisos
E para te lembrar que tu já morreste
E que não podes viver novamente.


O vento que te cruza o rosto é de um Ar que não tens
A côr que te carrega a alma é cinzenta de um chumbo triste e frio.
Não tens culpa mas também não precisas
Pois quem vive longe da sua vida
Apenas precisa de acordar todos os dias
De se levantar para seguir um caminho qualquer.
De narrar as histórias dos outros e as suas alegrias
De escolher, algures entre o nenhures e o que vier.


Ora...não és Poeta nem coisa nenhuma!
És um Espantalho a quem nem os corvos respeitam.
Não és Palhaço, não tens piada, nem és inteligente
És um falhado, nem um pouco mais do que mais alguém!
Morrerás anónimo pois mais não mereces
E sobretudo aliviado por não teres glória nem ter de regressar
Foste condenado a não teres lágrimas nem preces
A viver num mundo em que não tens Ar para respirar.


Eugénio Rodrigues, Novembro 2008

Foto de Rosalina Afonso

Sugestão musical No Air - Jordin Sparks feat Chris Brown