Olhar

Olhar
Estava eu perdido, misturado num mundo de coisas
Ligado a banalidades que nos fazem esquecer os nomes
Que apagam o dia após cada noite mal dormida
Anestesia do tempo que passava sem marcas nem diferenças
Um amorfismo galopante em tudo igual e em nada diferente.
Mas um dia, sem numero nem santo padroeiro
Um olhar atravessou a sala, procurou e fixou
E sem sair do lugar timidamente se aproximou
Puxou-me para o seu espaço perfumado e entregou.
Não houve entrega nem resistência
Furor temido ou bucólica lágrima,
Preparação ou feliz coincidência,
Compreensão ou inesperada dádiva.
No escuro da visível indiferença
Tornou-se numa suave fosforescência
Como um expresso da meia noite
Que repentina e inesperadamente ganha vida própria
E fulgor indomável de adolescente.
Um olhar que traduz mil fotos e um frenesim de palavras
Sem que precise sequer de articular os lábios ou embalar nas suas asas
Não sei se o destino o juntou na efervescência do acaso
Mas sei que é bem capaz de iniciar uma nova quimera
Porque é sedento, expressivo e afavelmente dado.
Quer mais, deseja conhecimento
E sofre a angustia de ser cortado pelo tempo
Tranquilo e sorridente, são os olhos de um rosto ardente
Que paira e espera por um momento diferente
Por uma oportunidade nova e recente.
Olhar que estás sempre comigo
O jeito doce como me abraças
A forma visível como sentes a minha falta
A maneira delicada como te mostras
O carinho que trazes quais luzes da ribalta.
Olhar, já senti, sou teu...
Eugénio Rodrigues Agosto 07
(Foto de Rosalina Afonso)
Sugestão musical – Travis, Closer